quinta-feira, 29 de março de 2012

LEIA NESTE BLOG OS CORDÉIS:
SER MINEIRO e O ESCRAVO CHICO REI

VISITE A:
Cordelteca Olegário Alfredo - Sabará -MG

A Cordelteca Olegário Alfredo (Mestre Gaio), está localizada na Cidade de Sabará-MG, nela se encontra um expressivo acervo de cordéis de vários autores do Brasil, com também matrizes de xilogravuras e livros sobre o assunto. Olegário Alfredo é Membro da ABLC - Academia Brasileira de Literatura e da ALTO – Academia de Letras de Teófilo Otoni. Com mais
De 100 títulos de cordéis publicados.
Veja a página: www.olegarioalfredo.com.br e o blog: www.cordeldeminas.blogspot.com

quarta-feira, 28 de março de 2012

Clube da Esquina em Cordel

O CLUBE DA ESQUINA
EM CORDEL

Autor: Olegário Alfredo (Mestre Gaio)
Membro da ABLC – Academia Brasileira de Literatura de Cordel e
ALTO – Academia de Letras de Teófilo Otoni-MG

Com o pensamento enlevado
Meu gênio poético atina
Para que possa escrever
O belo que a vida ensina
A trajetória vivida
E harmonia dividida
Pelo Clube da Esquina.

A nova década pela terra
De sessenta transcorria (1960)
No Brasil a ditadura
Desalento nos trazia
Só mesmo a juventude
Em sua inquietude
Nos despertava alegria.

Alguns músicos em Beagá
Sem nenhuma pretensão
Começaram a se encontrar
No início por diversão
Entre as ruas Divinópolis
Junto com Paraisópolis
Em busca de uma canção.

Um clube que não existiu
Mas todo mundo o conhece
Graças a mãe dos irmãos Borges
Este clube resplandece
No encontro de duas ruas
Onde brilham muitas luas
No bairro que não anoitece.

2


Canções que marcaram épocas
Com letras maravilhosas
Seus arranjos penetrantes
Pelas noites calorosas
Ecoavam pelos montes
Escorriam pelas fontes
Na Capital das Alterosas.

Jovens músicos com talentos
E distinta formação
Transitaram pela veia
De uma forte geração
Revolucionaram à cultura
Driblaram à Ditadura
Encantaram a Nação.

Foi um grupo que dobrou
A esquina de Beagá
E pelo mundo de meu Deus
Transpuseram, oxalá
Cantando pelo prazer
Viram o sonho acontecer
Por aqui como acolá.

Cada bairro ter seu grupo
Era prática natural
Os encontros do dia-a-dia
Um bendito ritual
Falar de música e poesia
Não fadava nostalgia
No curso da capital.

3

O que ficou para história
Tudo brotou duma esquina
Entre conversas políticas
E paquera de menina
Um grupo consolidado
E pelo mundo projetado
Como o Clube da Esquina.

Sobre o Clube da Esquina
Digo com sinceridade
Foi um clube imaginário
Dentro da mineiridade
Que surgiu sem pretensão
Por isso houve projeção
Pelo ciclo da amizade.

Sabemos que toda época
Traz seu tipo de linguagem
A poesia sempre vive
Em uma constante viagem
Transitando sem parar
Ocupando todo lugar
Não precisa de bagagem.

Neste Clube da Esquina
A poesia é cantada
Caminhando impressentida
E nunca inesperada
No tempo da escuridão
À cata do novo irmão
Rompendo o pó da estrada.

4


Quantos sócios deste Clube
Pelo mundo deve haver
Impossível de contar
Só quem sonha pode ver
Não existe noite escura
Que arrebata uma ternura
Sem que haja amanhecer.

Um Clube magnificante
E de forma singular
Onde os sócios dividiam
Solidão com o sonhar
Já a forma de expressão
Transmutada em canção
Sobressaía no cantar

Foi com Milton Nascimento
O ponta-pé inicial
Gravar um álbum duplo
Na época não era normal
Os empresários da Odeon
Apostando naquele tom
Pôs fé no potencial.

Para compor o projeto
Lô Borges foi convidado
Ainda bastante novo
Mas com talento aprumado
Disse Lô Borges: - Só vou
Milton tão logo aprovou
-Com Beto Guedes ao meu lado.

5


Assim foi que aconteceu
Como um tiro bem certeiro
Lô Borges e Beto Guedes
Lá no Rio de Janeiro
Morando com o Bituca
Todos com serena cuca
Agarrados no parceiro.

Mudaram pra Niterói
Lugar de tranqüilidade
Acharam paz para compor
Trabalho de qualidade
Visitas lá não faltavam
E os amigos só chegavam
Ampliando a irmandade.

Ronaldo Bastos presente
Como fiel escudeiro
Fernando Brant em Minas
Grande bardo mensageiro
Os cavalheiros no Rio
Formavam com muito brio
Um arquipélago mineiro.

Se diz do Márcio Borges
Mentor intelectual
Já o Milton Nascimento
Visioneiro mundial
União familiar
E que para prosperar
Se tornou fundamental.

6


Márcio Borges bom letrista
E de Milton o predileto
Desde os tempos do *Levy
Amigo dos mais seleto
Entre músicas e canções
Madrugadas e emoções
Irmão de fé e de afeto.

E com tanto reboliço
E também apreensão
Esses jovens se encontraram
Acertaram a solução
Lançar o Clube da Esquina
Carregado de adrenalina
E espalhar pela Nação.

Lançado em setenta e dois (1972)
O disco Clube da Esquina
Trazia como conteúdo
Qualidade e disciplina
Belas letras, nível alto
Flor que rompe o asfalto
Moçada que desatina.

O disco Clube da Esquina
Maravilha matinal
Considerado por todos
De vanguarda sem igual
Disco reverenciado
E de talento apurado
Pela música nacional.

7



A força do som de Minas
É de forma criativa
Canções puras que brotaram
Dentro da locomotiva
*Vera Cruz, ai que saudade
De um tempo sem idade
Tanta carga emotiva.

Um Clube que se formou
De maneira salutar
Melodias transcendentes
Mineirice secular
Viajando sobre o trilho
Matutando um estribilho
De Minas até o mar.

Temos no Clube da Esquina
Grande universalidade
Um clube de todo mundo
Entre os laços da amizade
Um pomar de muitos frutos
Rechaçado de tributos
Paz, amor e liberdade.

Gerações mais gerações
Quiçá pela vida inteira
Vão cantar pelas esquinas
Das cidades brasileiras
A toda herança herdada
Daquela rapaziada
Da doce terra mineira.


8

Músicas como o “Trem azul”
Um hino para o mineiro
Seguida de “San Vicente”
Verdadeiro cancioneiro
“Paisagem na Janela”
Junto com “Cravo e Canela”
“Trem de Doido” cantareiro.

Citando a bela canção
“Tudo que podia ser”
Seguida de “Cais e “Estrelas”
Só a “Lília” para ver
“Dos Cruces” “Um gosto de sol”
“Os povos” do arrebol
Também “Ao que vai nascer.”

“Um girassol da cor
do seu cabelo”” é capaz.
“Pelo amor de Deus” é bom
“Nuvem cigana” é demais
Nada será como antes”
Se não somos confiantes
Em nossa Minas Gerais.

Vem “Saídas e Bandeiras”
Número um e número dois
De novo “Clube da Esquina”
“Me deixa em paz” vem depois
Músicas que extrapolaram
E tão longe lá chegaram
De aviões ou carro-de-bois.

9

Todos do Clube da Esquina
Louvo com sinceridade
Beto Guedes e Lô Borges
Venturini de verdade
Logo vem Toninho Horta
Nos arranjos entrecorta
Batida de qualidade.

O poeta Márcio Borges
De grande conhecimento
Fernando Brant em parceria
Com o Milton Nascimento
Ronaldo Bastos carioca
Com Tavinho também toca
Dando o enriquecimento.


Tantos outros componentes
Neste imenso carretel
Wagner Tiso por exemplo
Coloriu este painel
Nesta minha louvação
Na canção do coração
Continuo no cordel.

Na sombra do grande Clube
Projetava o Clubinho
Os mais novos na escola
Depois som no cavaquinho
Melodias nascituras
Em pequenas criaturas
Iluminavam o caminho.

10

Peladas e bola de gude
E os Beatles na vitrola
Nico, Telo com Yé
Ouvidos finos na viola
De quebrada a Solange
Voz feminina que tange
Os jovens da corriola.

E circulavam na esquina
Amauri com João Luiz
Sônia e Tiú-Rastejante
Vem Zé Grandão, ora que diz:
- Felicidade na vida
Pra Landinha tão querida
Que só pensa em ser feliz.

Surge o Beto-Ronca-Ferro
E o Alan com o Reinaldo
Joãozinho Tiú-das-Trevas
Dá-lhe música com respaldo
A Vânia por sua vez
Repleta de sensatez
No Clube engrossa o caldo.

E assim com o viver
Vai-se o tempo pela estrada
A saudade silencia
Em uma música bem tocada
O crescer é tão normal
Nesta vida desigual
Para tão breve jornada.

11
Fim

Grande Mestre Gaio: capoeirista,
Cordelista. Artista múltipl de talento
Raro, alma sensível e generosa.
Com satisfação leio e releio seu novo
Cordel homenageando o Clube que vi
Nascer nas ruas de Santa Teresa. Belo
Trabalho. Parabéns, o Clube agradece.

Yé Borges


Olegário, Semp re assim, de sensibi-
lidade alva. Basta observar sua maneira
de ver o mundo, lendo seus livros e
cordéis que vamos de encontro ao mais
puro de sua alma. Sempre Gaio.

Gina Borges
Autora de Literatura Infantil e
Empreendedora Cultural.



12
A INTRIGA DO GALO
COM A RAPOSA

Autor: Olegário Alfredo membro da ABLC - Academia Brasleira de Literatura de Cordel e ALTO – Academia de Letras de Teófilo Otoni - www.olegarioalfredo.com.br

A intriga galo e raposa
É muito bastante antiga
Os dois nunca se truvaram
Vivendo em constante briga
A raposa fica sempre
Querendo encher sua barriga.

Mas o galo espertalhão
Não dá chance pra raposa
O galo tem sua galinha
Que é sua fiel esposa
A raposa traiçoeira
Não pega nem mariposa.

Vou contar daqui pra frente
Como tudo começou
Enganar o galo velho
A raposa já tentou
O galo por sua vez
Sei que nunca vacilou.

Este peleja se deu
No campo do Mineirão
Cruzeirense e atleticano
Estavam em discussão
De saber qual o melhor
O time da região.

1

Aqui nas Minas Gerais
Futebol lidera assunto
Muito mais que política
Religião ou de defunto
Sabemos que nosso galo
Na jogada chega junto.

O Cruzeiro é um time
De porte fenomenal
Pode se considerar
O melhor da capital
Além de jogar futebol
Faz trabalho social.


Em se tratando de bola
No cenário nacional
Para todos os mineiros
O Atlético é maioral
Possui a maior torcida
Do interior a Capital.

O galo é devorador
E tem porte soberano
No jogo do bicho é treze
O da sorte sem engano
Salve o treze vencedor
Que traz garra todo ano.

2

A raposa ficou de fora
Do forte jogo do bicho
Deus pôs ela pelo mundo
Sem perdão e sem capricho
A caminhar pela terra
Balançando o rabicho.

O juiz já apitou
Pra peleja começar
Todos nós vamos ver
Pêlo com pena a voar
Quero ver nesta batida
Quem na bola vai ganhar.


Galo:
- Veja bem dona raposa
Comedora de carniça
Tens fama de traiçoeira
Só pega bicho preguiça
Sua carne fedorenta
Não serve nem pra lingüiça.

Raposa:
- E você galo bobão
Gosta tanto de galinha
Fica catando minhoca
É só pra fazer gracinha
No campo de futebol
Não ganha nem na porrinha

3

Galo:
- Abra o olho raposinha
Eu já estou desconfiado
Este seu jeito de andar
De modo de requebrado
Isto é coisa de outro bicho
Cujo nome é o viado.

Raposa:
- Galo diz ser maioral
Só se for na fabulagem
Bicho homem quer sua carne
É sem sua camuflagem
E acabar de uma vez
Com a sua malandragem.


Galo:
- Seu campo de futebol
Conhecido como Toca
Também pode ser chamado
Um lugar de troca-troca
O meu é cidade do Galo
Lugar macho de badalo
Onde pia a jiripoca.

Raposa:
- As estrelas de meu time
São do Cruzeiro do Sul
Galo não tem distintivo
Nem no bolso do Raul
Minha camisa resplandece
A beleza do céu azul.

4

Galo:
- Sua torcida é fajuta
E a minha é de primeira
A raposa não tem raça
Sabe só é ser faceira
A torcida atleticana
É uma nação brasileira.

Raposa:
- Chega de papo furado
Vamos já pro futebol
Se eu não te pegar na garra
Eu te pego é no anzol
Vou fazer de suas penas
Um lenço de cachecol.

Galo:
- Eu que mando na Pampulha
Lá que fica o Mineirão
Onde a raposa viu o galo
Ser o hexacampeão
Raposinha morre de inveja
E com dor no coração.

Raposa:
- O Cruzeiro é o maioral
Em 2003 foi certeiro
Venceu a Copa do Brasileira
E Campeonato Mineiro
Ainda quer saber mais?
Foi campeão brasileiro.

5

Galo:
- O meu time é federal
Bate de qualquer maneira
Joga bola pra caramba
Até em terra estrangeira
Foi o único que já ganhou
Da Seleção Brasileira.

Raposa:
- Máfia azul nossa torcida
É de sangue italiano
Mancha azul, nossa charanga
Que detona o atleticano
O galo pra nós funciona
Como bandeira sem pano.

Galo:
- Em matéria de charanga
A do Atlético foi a primeira
Hoje tem a Galoucura
Da juventude mineira
Só as mulheres bonitas
Que seguram a bandeira.


Raposa:
- O meu time é ricaço
Tem campo bom pra treinar
Nossa Toca da Raposa
Lá na hora do papar
Serve um bom galo cozido
No almoço e no jantar.

6

Galo:
- Se seu time é ricaço
Já o nosso é da massa
Foi nascido no Brasil
Por isso tem muita raça
Sei que o seu veio da Itália
Por isso ele é tão sem graça.

Raposa:
- Eu sei que seus jogadores
Andam por todos os lados
Já foram da segundona
E por lá foram humilhados
O seu consolo foi ser
Campeão dos rebaixados.

Galo:
- A família da raposa
Tem seus filhos sem ter prole
E também no futebol
Fica só no bole-bole
Que é igual a cocô de vaca
Muito grande, porém mole.


Raposa:
- O Cruzeiro ganha tudo
E não é de fanatismo
Campeão no Voleibol
Como também no atletismo
Vocês do Galo representam
Atletas do cretinismo.

7

Galo:
- O hino do atleticano
É empolgante e gostoso
Já o hino de seu time
Tem o compasso choroso
Não alegra a torcida
Porque é muito moroso.

Raposa:
- Para de cantar de galo
E faça como o cruzeiro
Deixa de ser um malandro
Desça já de seu poleiro
Você deve respeitar
Todo time que é mineiro.

Galo:
- O meu time tem orgulho
Sobretudo é mineiro
Pois o nosso Atlético foi
Com seu tiro bem certeiro
O primeiro campeão
Do campeonato brasileiro.

O juiz determinou
Que terminasse o debate
A raposa mais o galo
Demonstraram ter quilate
Pois ninguém venceu ninguém
Ficando tudo no empate.

8

Cordel ser Mineiro

cordel ser mineiro
Autor: Olegário Alfredo (Mestre Gaio)
Membro da ABLC Academia Brasileira de
Literatura de Cordel
e ALTO Academia de Letras de Teófilo Otoni


CORDEL SER MINEIRO

Dizem que Minas são muitas
Vivendo no mesmo Estado
Norte, sul leste e oeste
Mineiro por todo lado
De costumes diferentes
Cada qual com seu ditado.

Por isso que vou falar
Como é que é o mineiro
Circunspecto, democrata
Cordial e prazenteiro
Rodeado de montanha
Difere do brasileiro.

Vem de seus antepassados
O tudo que lhe convém
O povo todo conhece
Ao falar se sente bem
Qualquer coisa pro mineiro
É conhecida como trem.

Ser mineiro por inteiro
É não dizer o que faz
E nem o que vai fazer
Sabendo que é capaz
Mesmo em tempo de guerra
O mineiro vê a paz.
1
Fala pouco escuta muito
O mineiro que é da gema
Finge que não sabe nada
Desvendando um teorema
Mantém calmo e sereno
Ante de qualquer problema.

Mineiro finge de bobo
Mais é muito inteligente
Vende queijo no mercado
Esconde ser presidente
De banco que tem dinheiro
Diante de nossa frente.

Um bom mineiro dos “bão”
Não laça boi com embira
Não dá rasteira no vento
Nunca perde na catira
E não desvia a atenção
da presa que tem na mira.

Dizem que todo mineiro
É um ser desconfiado
Simples e religioso
Conservador e educado
Tem prudência é cauteloso
Precavido e ajuizado.
2
Pois a arte de ser mineiro
Sobrevive em todos nós
Conhece um rio por inteiro
Da nascente até a foz
Nunca veste uma calça
Sem antes saber do cós.

Gosta de fazer política
E apreciar uma mulher
Sabe o que alimentar
Traça tudo que vier
Levando a vida na manha
Mineiro chega aonde quer.

O mineiro de verdade
Sabemos que não hesita
Gosta bem de pão de queijo
E de receber visita
Vive de sentir saudade
Quando o peito lhe palpita.

Mineiro gosta de praia
E se diverte pra valer
Mas não troca um friozinho
Que vem do amanhecer
De sua cidadezinha
De onde leva o seu viver.
3
Adorar um futebol
É outra coisa do mineiro
Em qualquer canto de bar
Discute com o companheiro
Quem será o campeão
Se o Galo ou o Cruzeiro.

Acordar bem humorado
É sua profissão de fé
Cinco horas da manhã
O mineiro está de pé
Bota água pra ferver
Que é pra coar café.

Mesmo sendo um domingo
Mineiro não tem preguiça
Chama os filhos e a mulher
E vão todos para a missa
Depois todos vão comer
Pão de queijo com linguiça.

Almoço fim de semana
Quase sempre é diferente
O mineiro gosta sempre
De tomar uma aguardente
Para abrir o apetite
Refrescar um pouco a mente.
4
A comida do mineiro
É de prato variado
Um franguinho caipira
Com angu e com quiabo
Cansanção e ora-pro nóbis
Com um bom leitão assado.

Depois vem de sobremesa
A goiabada cascão
Um queijinho bem curado
Que se pega com a mão
Cafezinho bão da hora
Completando a refeição.

Mineiro do interior
Na venda compra fiado
Ele mesmo é quem anota
O tudo que foi comprado
O dono não se preocupa
Em ficar desconfiado.

Mineiro quando vacila
Escorrega mais não cai
Gosta de entrar por baixo
Para ver como que sai
Quando está embaraçado
Tranquilamente diz: UAI.
5
Mineiro gosta também
É de criar um passarinho
Um canário na gaiola
A trinar um miudinho
Faz com que o seu dono
Nunca sinta se sozinho.

O mineiro prevenido
Nunca sai sem agasalho
Prefere o mesmo caminho
Desconfiando do atalho
Sabe que da árvore velha
Pode se quebrar um galho.

Mineiro sabe escutar
Música de qualidade
Uma seresta com chorinho
Só lhe traz felicidade
Curte um rock diferente
O mineiro da cidade.
O lema do bom mineiro
É amar a liberdade

Praticar cidadania
Por prazer e dignidade
Mantém sempre a porta aberta
Para a hospitalidade.
6
É comum na mineirice
Não tolerar desacato
Lê jornal todos os dia
Pra ficar dentro do fato
Sabe com antecedência
Quem que vai pagar o pato.

Mineiro quando tem raiva
Sente dor pela barriga
Dá um boi de garantia
Para não entrar na intriga
Mas também dá uma boiada
Para não sair da briga.

Com estranhos o mineiro
A conversa não estica
Só sente a dor na pele
Quando alguém lhe belisca
Educação e gentileza
Sabe bem como pratica.

Só acredita na fumaça
Se ver o fogo de perto
E sabe como ninguém
Tirar água do deserto
Finge de ser bobalhão
mas no fundo é esperto.
7
Em trato de decisão
Só arrisca com certeza
Compreende com razão
Que beleza não põe mesa
E das mulheres compreende
Que Regina não é Teresa.

Ser mineiro também digo
É ter marca registrada
É saber falar “UAI”
Diante da namorada
Completar maioridade
Já com o pé pela estrada.

Ser mineiro é ter pureza
Ter coragem e bravura
Gostar de “causo” e história
Esta é sua postura
É ter espalhado na estante
Livros de literatura.

Mineiro levanta cedo
Pra ver o nascer do sol
Adora ver as crianças
A jogar o futebol
De tardinha gosta muito
De curtir o arrebol.
8
Mineiro na mineirice
Leva prosa de doutor
É um ser religioso
E também inovador
Gosta de subir montanhas
E ter vida interior.

O mineiro também sabe
Ser poeta e literato
Manha e manemolência
Ele aprende com o gato
E sabe que a cobra brava
Só rasteja pelo mato.

Conhece muito o mineiro
Os ditados populares
Provérbios, anexins
Também coisas seculares
O saber de ser mineiro
É amar todos lugares.

Ser mineiro ainda falo
É ter a sabedoria
Simplicidade e modéstia
É sua especiaria
Em qualquer canto em que está
Transmite logo alegria.
9
Muito mais sobre o mineiro
Eu digo logo a vocês
Gosta de dar um desconto
Pra não perder o freguês
Da galinha colhe os ovos
Deixando um para um indez.

O mineiro também sabe
Não olhar diretamente
Finge não dar atenção
Agindo sabiamente
Diz sempre muito obrigado
E se mostrando sorridente.

O sentido do mineiro
É fazer de um fracasso
O espírito da vitória
Dentro do mesmo compasso
Sem perder motivação
No ritmo do mesmo passo.

Mineiro dono do “Uai”
De sotaque natural
Fala baixo escuta muito
Preservando a moral
Não é santo de pau oco
E nem é cara de pau.
10
O mineiro mineirando
Gosta mesmo de mercado
Não despreza uma rabada
Não escorrega no molhado
Come tudo que vier
Pois comer não é pecado.

O mineiro não perde o trem
Nem diz que trem vai pegar
Um trem bom é qualquer coisa
Pra se ver ou mastigar
Trem ou troço tem bastante
Não precisa procurar.

O mineiro quando morre
Por todos é consolado
Morrer é acontecimento
Ninguém de fato é poupado
Já disse Guimarães Rosa:
- Não morreu, ficou encantado.

Despeço-me deste cordel
Com saudações cordiais
Quem conheceu este Estado
Não o esquecerá jamais
Salve todos os mineiros
E salve Minas Gerais.
11
Mineiro também eu digo
É ser especialista
Paquerar uma mulher
Com sutileza dum artista
Dize pouco de si próprio
Mesmo que a jovem insista.

Minas Gerais também é
Terra da bela mineira
Sobretudo inteligente
Peremptória e faceira
Se bobear ela sabe
Levar água na peneira.

Em Minas também cultiva
Uma viola caipira
Uma congada de primeira
Como também uma catira
Uma folia pra dançar
Se o turista interessar
Venha cá e logo confira.

Não podemos esquecer
Do mineiro em romaria
Ele frequenta festa santa
Para alegrar o seu dia
E na hora de dormir
Sabe rezar Ave-Maria.
12
Fim

terça-feira, 27 de março de 2012

cordel Chico Rei

CHICO REI EM CORDEL
Autor Olegário Alfredo (Mestre Gaio)
Membro da ABLC e ALTO.

CHICO REI

A vida que nos rodeia
É feita de brevidade
Viva bem com alegria
Deixe de lado a vaidade
Agradeça todo dia
Nosso Pai da Eternidade.

À Senhora do Rosário
Padroeira do congado
Cubra todo ser humano
Com seu manto sagrado
Iluminai nosso caminho
E a Deus seja louvado.

Vou narrar daqui pra frente
O que trago na memória
A vida de Chico Rei
Sua dor e sua glória
Que se tornou para Minas
Um marco de nossa história.

Chico Rei teve este nome
De batismo no Brasil
Francisco precisamente
Marca de gente civil
Como escravo ou como rei
Sempre dócil e gentil.

1

Chico Rei foi um Soba
Nascido no reino congo
Foi criado na riqueza
E no batuque do jongo
Era muito inteligente
E de pensamento longo.

Chico Rei vivia antes
Em sua tribo sem zanga
Usava colares de ouro
Em formato de miçanga
Cujo verdadeiro nome
De real era Calanga.



Tudo mesmo começou
No tempo da escravidão
Onde os negros africanos
Sofrendo desolação
Tratados por homens brancos
Como entes sem coração.

Muitos negros como escravos
Foram pra muitos países
Levados por gente branca
Arrancados das raízes
Cruelmente eles viviam
Maltratados e infelizes.

2

No Brasil, colônia rica
De posse de Portugal
Trabalhar como escravo
Era rotina normal
No princípio no engenho
Dentro do canavial.

Decaído o ciclo da cana
Que foi muito duradouro
Minas Gerais de repente
Tornou-se um fervedouro
Os bandeirantes por lá
Descobriram muito ouro.

- Queremos escravos bons!
Nas Minas lá dos Gerais
Que trabalhem noite e dia
Como loucos animais.
Diz o Rei de Portugal
Em palavras guturais.

Os caçadores de negros
Abutres e carniceiros
Raptar tribos de reis
Queriam ser os primeiros
Assim dessa selvageria
Surgem os afros brasileiros.

3

De volta pro Reino Congo
Veja bem o sucedido
O reinado de Calanga
Viu-se todo invadido
Começa a destruição
De um povo tão querido.

Calanga na sua tribo
Era monarca guerreiro
E do Deus Zámbi-Apungo
Um sacerdote cordeiro
Prosperidade pro povo
Era o lema verdadeiro.

Mil setecentos quarenta
Com o templo iluminado
A tribo toda em oração
Para o seu Deus cultuado
Eis que surge lá de fora
Gritos de um povo assustado.

Eram piratas maldosos
Que invadiam o terreiro
Vinham pegar ser humano
Trabalhador ou guerreiro
E levá-los pro Brasil
A troco de bom dinheiro.

4

Todos rudes e perversos
Praticantes da maldade
Quando viam resistência
Matavam sem piedade
Mulheres como e crianças
Sem se importar com a idade.

Já sabiam os piratas
Da carga ser de valor
Era a Tribo do Calanga
Rei do Congo Imperador
Sendo ali toda humilhada
Diante a ordem do opressor.

De posse da captura
Do povo dessa Nação
Foram todos acorrentados
A arrastados pelo chão
Página negra da história
Símbolo da escravidão.

Debaixo da chicotada
Ritual de dura pena
Indefesos seres humanos
Sem ninguém deles ter pena
Levados para embarcação
Com nome de “Madalena”.

5

Choros e gritos horríveis
Eclodindo pelo ar
O rei daquele reinado
Não tinha como lutar
Transformando-os em escravos
Partiram para além mar.

A carga de ébano humano
Pronta para travessia
Do grande Oceano Atlântico
Para nova moradia
Um lugar desconhecido
Lar feito de covardia.

A família de Calanga
Se vendo submergida
Não podia pressentir
Que a dor daquela partida
Logo representaria
A travessia da vida.

Pelo mar vai o “Madalena”
Carregado de alimento
E pelos porões soturnos
Muita dor e sofrimento
Corpos nus amontoados
Num inferno fedorento.

6

Três andares de porões
No grande navio negreiro
Acorrentados pelos pescoços
Amontoados no poleiro
Ia o reinado de Calanga
Para o solo brasileiro.

Muita dor e sofrimento
Também sangue aos borbotões
Os que ali morriam
Impedidos de perdões
Decerto seriam comidos
Por famintos tubarões.

Tempestuosa viagem
Para a terra do sem-fim
A presença do diabo
Afastava o querubim
Vai-se o Rei do Reino Congo
Sem riqueza, sem marfim.

Logo vem a tempestade
Grita o chefe sem parar
- Joguem tudo que puder
Nas profundezas do mar
Corremos imenso risco
Da embarcação afundar.

7

Muitos negros também foram
Atirados no oceano
Mais de duzentos sabemos
Fazia parte do plano
Noite de carnificina
Cometidas com o humano.

Os navegantes afoitos
Com medo da castidade
Pegam a Rainha e sua filha * (a Rainha Djalô e filha Ítulo.
Sem nenhuma piedade
Oferecem os dois corpos
Ao Deus da tempestade.

Assim pensavam eles
O mar vir em calmaria
Negro não é ser humano
São filhos da selvageria
Oferenda para os deuses
Quando estão em euforia.

E chegam em terra firme
Só Calanga e seu filho
Talvez com mais cem escravos
No baticum do estribilho
Atirados pelo chão
Corpos nus, olhos sem brilhos.

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No mercado negro à venda
Passavam o dia inteiro
À espera de comprador
Que tivesse bom dinheiro
Ficavam mirando o mar
Lá no Rio de Janeiro.

No Brasil o Rei Calanga
Agora era o Chico Rei
Adotou o catolicismo
Batizado por um Frei
Estava ele consciente
De seguir a nova lei.

Chico Rei religioso
Nos princípios da irmandade
Atraiu para o seu lado
Major Augusto de Andrade
Um escravista humanitário
Que odiava crueldade.

Chico Rei e seus confrades
Aportados pelos cais
Acreditava na força
Lá de seus ancestrais
O destino assim se fez
Ir para Minas Gerais.

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O Major sentiu firmeza
No bando da negraiada
Assim a sua vendagem
Por lá foi negociada
Começaria naquele instante
A nova e dura jornada.


A viagem para Minas
Foi toda feita a pé
Escalando a Mantiqueira
Das alturas pro o sopé
Chico Rei tomava frente
Ancorado pela fé.

Morando no novo solo
Terra da gente mineira
Chico Rei e os companheiros
Vindos de Tribo guerreira
Foram trabalhar na Mina
De nome “Encardideira”.

Esta Mina pertencia
Ao forte Major Augusto
Escravista considerado
Como ser humano justo
A ele Chico prometera
Achar ouro a todo custo.

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Pois a Mina Encardideira
Era a melhor da região
Em dia de chuva forte
Achava o ouro de aluvião
E tudo isso alegrava
Ao generoso patrão.

Vila Rica era a Comarca
E que hoje é Ouro Preto
Muita língua misturada
Verdadeiro dialeto
Tupi, português, africano
Eram à base do esqueleto.

Mas com o passar do tempo
Vê-se a riqueza terminada
Para outra mina de fato
A turma seria levada
O Major Augusto Andrade
Larga a mina abandonada.

O pouco que Chico Rei
Ganhava no labutar
Guardava todo vintém
Em um seguro lugar
Pois a sua alforria
Um dia iria comprar.

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Chico Rei a essa altura
Já falava o português
E passara a ser feitor
E com todos era cortês
Uma herança adquirida
De seu povo congolês.

Tratava com igualdade
Todos em sua redondeza
Sendo branco ou escravo
Da pobreza ou da riqueza
Respeitava com amor
Sobretudo a Natureza.

Quem com ele trabalhava
Se sentia muito bem
Chico Rei catolizado
Em tudo dizia amém
A sua filosofia era
Nunca amolestar ninguém.

Há tempos em Ouro Preto
Todo povo já dizia
A turma de Chico Rei
Para comprar a alforria
Nos cabelos punham ouro
E na igreja no lavadouro
O ouro ficava na pia.

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A turma de Chico Rei
Não davam ponto sem nó
Sabiam que os maus feitores
Nunca deles tinham dó
Então por entre as unhas
Escondiam o ouro em pó.

Um rei não perde o reinado
Nem perde a sabedoria
Chico Rei tinha certeza
De tudo que ele fazia
Pois este ouro recolhido
Era o sinal da alforria.

O Major naquela altura
Levava vida bizarra
E não é que a Encardideira
Sem ter porque foi à garra?
Os negros em zombaria
Viviam em algazarra.

- Será que o Major Augusto
Colocará a Minas à venda
Ela que há tanto tempo
Foi a maior fonte de renda?
- Diziam os negros livres
Na porta de uma vivenda.

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Um dia de domingo livre
Chico Rei em passeadeira
Sonha com Santa Efigênia
Lá na Mina Encardideira
Dizia que ele libertaria
Os negros pra vida inteira.

Trabalhando sem parar
Além da capacidade
Chico Rei pelas ladeiras
Daquela rica cidade
Com o dinheiro que ajuntou
Comprou sua liberdade.

Chico Calanga, agora forro
Sente a vida melhorar
E o seu filho certamente
Logo iria alforriar
E a Mina Encardideira
Poderia já comprar.

Vai-se a vida contra o tempo
Tempo que não volta mais
A saudade era tamanha
Da África e seus rituais
Bons ventos da liberdade
Sopram por Minas Gerais.
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Com fé em Santa Efigênia
E a Senhora do Rosário
O Rei negro sempre tinha
Devoção no escapulário
Dessa forma transformou-se
No mais fiel libertário.

Comprou sua liberdade
A do filho em seguida
E depois toda Nação
Por longa data sofrida
Agora se viam livres
Da chaga vil da ferida.

A tribo de Chico Rei
Juntamente com seu filho
Pelas ruas caminhando
Nos olhos um novo brilho
A palavra lava a lavra
Já não dá no trocadilho.

Chico Rei religioso
Com espírito da luz
Com seu povo escravizado
Constrói apoiado em Jesus
A Igreja Santa Efigênia
Lá no alto Morro da Cruz.

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Pelos anos em seguida
Apoiado na Irmandade
Da Senhora do Rosário
Viu nascer à liberdade
Nos tambores da congada
Pelas ruas da cidade.

Este rito se espalhou
Por todas Minas Gerais
Os cortejos transmitiam
Mensagens celestiais
Vindo de Zámbi-Apungo
Terra de seus ancestrais.


Todos cristãos de Ouro Preto
Chegando seis de janeiro
Elegem um Chico Rei
E passam o dia inteiro
Em procissão pelas ruas
Relembrando o cativeiro.

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